segunda-feira, 27 de julho de 2009

O bêbado apaixonado (rejeitado)

Ai! Não sei o que fazer dos meu olhos!
Sei que são esferas que bóiam
E que meus copos de vinho dão alguma vida.
Mas por que chorar,
Se daqui já vejo a chuva,
Com meus pés nus roçando o ar,
Com meu dedos acompanhando o fado
Da minha caneta bêbada que dança?

Condeno os meu olhos por terem te visto
Por antes disso não fecharem
Por antes disso não cegarem
Interrompendo, em algum ponto, o estímulo de minhas mãos.
Não sei para quem escrevo
Se me recuso então compor para ti
E me agarro a uma alcoólica fantasia
E vibro com o tremor choroso de meus lábios.

Com a opacidade lacrimada
Castigo os meus olhos por terem registrado
Tua pele de estrelas maceradas
Teu andar de criatura encantada
Teu sorriso de felicidade
Do qual já não faço parte.

Abro-me em recusa
E peço a ti a minha abolição.
E que meu sentimento termine
Tal qual uma simples música
E que este seja enterrado
Na mais distante Escócia
Às margens de um monstruoso lago
Comigo tocando uma impossível fúnebre ópera
Numa difícil gaita-de-foles.

Acompanhe-se do pôr-do-sol
Levando consigo toda a luz
Não iluminando mais os meus dias.
Que eu, repousado na lua,
Aguarde novas luminosas horas
Ou, para passar o tempo,
Eu me agarre a uma baleia
E atravesse os oceanos.
Que testemunhe eu partos salgados
Que eu fuja do inverno com os pássaros
Que procuram sua própria primavera.
Que pelo sangue dos meus pulsos tu te esvaias
Que do alto das nuvens
Despenques de minha alma
E que de tanto eu escrever
Tu passes de dentro de mim
Para detrás das palavras.

Eu te entrego para as fadas
Cuido de meus joelhos
Recolho meu olhar caído em alguma mesa
Ao lado de um romance de Jorge Amado.
Desligo as lâmpadas
Mudo de lugar os quadros
Volto a escrever para te tirar do quarto
Tua assombração alucina meu olfato.
Estou curado, eu sei.
Nunca mais vou beber...

Angelo A. P. Nascimento
(08 de agosto de 2001)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Eu acho que vi o amor

Esse mês tenho andado com a cabeça ruim para escrever, sem idéias, sem achar as palavras certas. Em verdade, não sei nem que sentimento quero pôr aqui; algo mais denso ou, quem sabe, algo mais leve, mais humorado.
Mas, por outro lado, Julho tem tido suas experiências interessantes: vi e falei com pessoas que há muito não partilhava da presença. E foi muito bom, com especial referência a duas amigas que hoje estão distantes, uma no Maranhão e outra em São Paulo, as quais estimo de coração.
E renovando o "falar em amizade", essa semana participei da organização de uma comemoração do "Dia do amigo" de um grupo de pessoas portadoras de doenças crônicas, na Unidade de Saúde em que trabalho. Elas revelaram seus sentimentos umas as outras, trocaram abraços, houve música e tudo mais. Entretanto, uma situação me chamou a atenção: na simplicidade das pessoas que compunham aquele grupo de pacientes, uma senhora levantou-se com um pedacinho de papel na mão e começou a cantar. Fiquei tão preocupado em entender cada palavra que ela entoava, que mal me importei em saber de sua afinação.
Com uma rosa na mão, ela dirigiu-se a outra mulher, também paciente, e abraçou-a ternamente dizendo:

- Você é minha amiga e você sabe por quê.

E a outra respondeu:

- Sim, eu sei.

Aquele abraço foi tão demorado, tão verdadeiro, com tanto sentimento...
Acho que se a gente pudesse ver o amor, ele seria daquele jeito, sem reservas, inteiro.
Aquele abraço, que eu tive o privilégio de ver, tinha a força para justificar uma vida inteira e foi um dos momentos mais lindos que já presenciei!
Ainda agora, dois dias depois, encontro-me inundado de tanta emoção e isso renovou minha fé nas pessoas.


[Para todos de dentro do meu coração, de fora dele, para os que acham que estão fora e para aqueles que se perderam do meu amor.]
Angelo A. P. Nascimento

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Queridos amigos

Creio que, mesmo que as pessoas mudem e suas vidas se reorganizem, os amigos devem ser amigos para sempre. E mesmo que não tenham mais nada em comum, sendo apenas vítimas das bifurcações de caminhos, devem ainda assim compartilhar as mesmas recordações, num ritual interno de fidelidade ao que foi sentido sinceramente.
Pelo Dia do Amigo que se aproxima, coloco uma foto histórica nossa, já que tem tem ficado cada vez mais difícil reunir todos.
Há um lugar de presença cativa e constante a vocês: o coração.
Abraços enormes,
Angelo A. P. Nascimento

terça-feira, 14 de julho de 2009

Luminosidades



Dirijo,
Atravesso a noite contra o vento frio
Seu nome sem pronúncia
Arde nos ouvidos
E, surdo, me arrepio
Contemplando estrelas de faróis.

Dirijo,
Estilhaços me cegando no caminho
Nosso amor farfalhando minhas orelhas
Tuas mãos e minhas tolices derradeiras
São detalhes que me fazem tão sozinho.

Angelo A. P. Nascimento
(2000)

Saudades de minha vó

Esse mês seria o aniversário de minha avó e escrevo só para registrar tanta saudade que eu sinto. Quando fico alegre ou triste, sempre lembro dela. Tem horas que até sinto seu cheiro de aconchego, próprio dos seres que magicamente se tornam avós.
E minha avó era uma figura!
Esse foi um diálogo nosso que nunca esqueci:

- Vó..
- Quié?
- A senhora me ama?
- Agora não, Angelo, estou assistindo minha novela!

Apenas sorri e deitei minha cabeça em seu colo.

Angelo A. P. Nascimento

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Sentimentos

Talvez ninguém entenda
O que eu passo agora.
Talvez só caiba a mim
Encaixotar essa agonia.

Vejo um céu tão grande
E apenas uma lua.

Talvez nada no mundo compreenda
Esse escândalo mudo em mim.
Apenas sentado,
Como quase em um milagre,
Perco o meu sono.
Mas não foi só isso que eu perdi,
Perdi as legendas exatamente
Daquela parte da vida.

Tenho comigo a última opção,
Mas resta tanta coisa
Que tenho a sensação
De que me distraí em algum momento,
De que algumas folhas caíram
E o sol se pôs inconformadamente.

Tenho memória apenas
De coisas cotidianas
Que acabaram se dispersando.
Não tenho respostas.
Tenho apenas sentimentos
E não sei o que fazer com eles.

Angelo A. P. Nascimento
(2004)

terça-feira, 7 de julho de 2009

Sobre você

"Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue... Se sentir saudades, mate-a! Se perder um amor, não se perca! Se achá-lo, segure-o. Circunda-te de rosas, ama, beba e cala. O mais, é nada!"
(Fernando Pessoa)

Já dizia alguma poetisa aí que não me lembro o nome: "é preciso renovar-se!" Reformular-se é uma necessidade básica para poder seguir em frente sem permitir que pedaços seus fiquem ao longo do caminho. Encontrar uma nova saída, encontrar uma atitude ponderada, encontrar a tranquilidade frente as coisas impassíveis de mudanças.
Aceitar que precisamos uns dos outros não é a mesma coisa de se admitir dependente. Ao passar do tempo, descobrimos que nossa independência cresce à medida que nos relacionamos sadiamente com outras pessoas. Isso é renovar-se, manter-se em movimento. Deixar coisas para trás que já não nos revestem de seguranças, embora haja dor no processo. E geralmente sempre há...
Tudo que precisamos é encontrar a fonte que jorra a coragem para a mudança que todos nós procuramos. Não percamos tempo procurando em lugares ermos, em outras pessoas, em objetos. Olhe apenas para dentro de si. Não tudo, mas quase tudo que você necessita para ser melhor está lá. Acredite em você! Tire um tempo e viaje a si mesmo. Você próprio é um grande espetáculo!
Angelo A. P. Nascimento

domingo, 5 de julho de 2009

Chuva

(Praia da Ponta Negra - RN - em 03 de julho de 2009)


Queria poder entender a violenta sutileza que move o mundo e que funciona como algoz da minha vida. Pergunto ao meu café da manhã se ele se sente tão confuso quanto eu: pronto para ser devorado. Como são engraçadas as experiências se movendo, uma atrás da outra, mesmo parecendo que não saímos do canto, mas sofrendo e aprazerando-se das mais diversas situações.
Queria tanto compreender a complexidade satisfatória de minhas fantasias e dar um breque à procura e ficar assim como estou, parado, observando a solidez temporal, mas sem ansiedades, sem apertar contra o peito calejado tantas rosas hipotéticas.
Gostaria de me livrar dos pesos que se acorrentaram aos meus pensamentos e não ver o seu nome gravado neles, como algemas invisíveis que me impedem de dar continuidade à marcha inevitável de viver. É tão ridículo ver estes mesmos pensamentos tomarem forma e me digerirem a cada lágrima que brota desobedientemente, me dando o tamanho significante da situação.
Já não sei mais o que sou, depois que me acompanhei de sua ausência, de quantas amarras me prendem a circulação e forçam a asfixia das atitudes.
Tenho medo de dormir, desde o dia em que descobri que o escuro muda de forma e a massa de ar brinca mostrando os momentos que não vivemos. Estou tão cansado de luzes artificiais para espantar a noite! Queria que amanhecesse de verdade, de modo que eu não precisasse me convencer das lâmpadas.
(Apressa-te, dia, em meu auxílio, porque preciso de fotossínteses, de firmar novas raízes e o oxigênio dos grandes problemas já é por demais rarefeito.)
Até mesmo as minhas palavras são verdes diante da maturidade de minhas dores, acentuando a disritmia do sentir e extravasar. Creio que sou um invólucro de sensações, emoções tantas comprimidas. Sou pequeno para o muito que sinto. Tenho incomensuráveis medidas interiores e acho que, por isso, seja errado eu ser concreto.
Acredito que ser etéreo é um sonho, mas é de coerente idéia a minha personalidade plasmada. Determinados elementos têm a capacidade de reunir. Pergunto-me se você é a criatura que me condensa.
Apesar das distâncias, é por você que chovo todas as tardes no jardim de suas promessas.


Angelo A. P. Nascimento

(27 de maio de 2000)

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Silêncio

Pura falta de inspiração me toma esses dias, não sabendo o que escrever e não conseguindo organizar qualquer idéia. Queria postar algo mais divertido, mas não ando na lista do Top 10 bem-humorados da semana. Queria escrever outra poesia, mas a que eu quero é de se jogar do vigésimo andar e, como já postei umas pesadas recentemente, tenho medo de me tornar responsável por alguém que amarrou uma pedra no pescoço e se jogou no Ganges, ou no Potengi, ou no Tietê, ou no riacho de sua cidade (vale açude). Então, para fugir desse marasmo mental e tentar neutralidade, lá fui eu buscar mais coisas guardadas (não, eu não estou fazendo faxina para encontrar tanta coisa antiga!) e achei um poema dessas épocas em que nada acontece, reinando a monotonia. O texto que segue é de 28 de agosto de 2001. Sensações se repetem.


Aguardo a inspiração (demore não, "fia"!)

Abraços a todos.

Angelo

Tudo em volta está em estranha calmaria
Papel, lápis e eu nos olhamos
E sobre nada temos conversado.
Silêncio, sórdida estampa,
Não há palavras a serem soltas
Não há nada a ser dito
Não há nenhuma dor
Não há nenhum amor
Não há gritos ou mexericos.
O mundo está em sua órbita
O coração está bem em seu lugar
Não há lágrimas ou sorrisos
Nem inimigos
Nem amigos
Não há solidão ou saudade
Tudo está em estase
O silêncio,
Só ele...
(Angelo A. P. Nascimento)
Related Posts with Thumbnails